Uma estória de amor anti-romântico, periférico e paraense. Por Alice Abdon

Desculpe o incomodo, preciso falar dele.
Alice Abdon Garcia para Diário.
Conheci ele no mormaço. Essa frase pode parecer anti-romântica se você imaginar alguém tocando fruto sensual numa palafita abarrota de gente aqui em Belém. Mas o brega em questão era aquele lugar que todos as amigos iam nos anos 2013–onde ouvia-se tudo menos brega. Ele era brega. Minha irmã dançava brega. Eu não dançava mas ia acompanhando minha irmã no brega. Ele estava lá. Dançando. Breado. Nunca vou me esquecer: a música era "São amores", da banda Quero mais.
Quando as catirobas fechavam os olhos imaginando amores, ele fazia sinal de arma com a mão pro alto (pei pei pei). Quando ele tremia, elas mexiam o ombrinho. Quando se arredava pro lado, dava topada com elas que se lançavam la de fronte. Os olhos esbugalhados dele, sempre imensos e castanhos, deixavam claro que ela não fazia ideia do que estava fazendo. Foi paixão à primeira vista. Parece que foi tudo tão imenso quero tanto te amar. Só pra mim, acho. Tava como criança perdida.
Passamos algumas madrugadas conversando inbox no face, ao som do Pop e Nelsinho Rodrigues. Ele me chamou de você (sabia que já queria). De lá, nos fomos pras chamadas em vídeo. Do face pro zapzap. Começamos a namorar quando eu tinha 20 e ele 23, mas parecia que a vida começava ali. Vimos todas as novelas. Algumas várias vezes. Fizemos todas as receitas existentes de #gororoba. Queimamos meia dúzia de xarão de comida porque ninguém sabia cozinhar. Escolhemos móveis sem pesquisar se eles passavam pela porta. Inventamos alguns passos de brega juntos. Fizemos uma dúzia de sumano novos e junto com eles andamos por ai pelas ruas da vida. Sofremos com as candinhas, rimos com os shippers. Viajamos Belém dividindo o fone de ouvido. Ananindeua, Bengui, pedreira, jurunas. Dos dez melodys que mais gosto, sete foi ele que me mostrou. As outras três foi ele que compôs. Aprendi o que era #BOREEII e também o que era #Jáéjá, as piriquita despintada e os moleque doido kkkk e outras palavras que o Word tá sublinhando de vermelho porque o Word não teve a sorte de ser casado com ele. Um dia, terminamos. E não foi fácil. Choramos mais que final de RexPa. Mais que na separação de Chimbinha e Joelma. Até hoje, não tem um bregaço que eu vá em que alguém não diga, em algum momento: quedi ele? Parece que, pra sempre, ela vai fazer falta. Se ao menos eu tivesse ovada, eu penso. Levaria pra sempre ele comigo.
Essa semana, pela primeira vez, vi o vídeo que a gente fez juntos —não por acaso uma história de amor. Achei que fosse chorar tudo de novo. E o que me deu foi uma felicidade muito profunda de ter vivido um amor drx mesmo na vida. E de ter esse amor documentado num filme —e em tantos vídeos, músicas e crônicas. Não é lorota. Não falta nada.

* Alice é formada em Secretariado Trilíngue pela UEPA, pós graduada em Comunicação Integrada e moradora do Bengui.

Comentários

  1. Não sou fã do excesso de regionalismo muito comum nas letras paraenses, mas nesse caso seria mais que essencial, permite que se vivencie um pouquinho disso tudo tão confuso, profundo, bom e dolorido que chamam de amor. Deu vontade de ler mais. Bate uma gratidão por ler isso.

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  2. Boa tarde! Gostei particularmente da maneira simples e às vezes descompromissada da construção do texto, a inserção das expressões corriqueiras de Belém são peças chaves para entender, ou pelo menos expressar, o movimento e a essência particular do relato. Ademais é lúcido, não precisei conhece-la e nem de muitos pormenores para captar o início, fim e meio, e que quem sabe agora, sob o olhar da experiência, são melhor relatados. Ótima contribuição!

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